Salud Brasil Campinas, São Paulo, Viernes, 29 de mayo de 2015 a las 20:20
Política de saúde

Empresas de planos de saúde financiaram 131 eleitos em 2014

Os resultados do levantamento podem ajudar na discussão sobre a reforma política no país, já que o financiamento de campanhas eleitorais é um dos pontos mais polêmicos nesse debate

Patrícia Santos/ComCiência/Labjor/DICYT - As doações de empresas de planos de saúde ajudaram a eleger 131 candidatos no Brasil em 2014, segundo o relatório de pesquisa “Representação política e interesses particulares na saúde”. Depois das eleições, essas empresas se beneficiam de situações como subsídios públicos, vigilância leniente no setor e até cargos na Agência Nacional de Saúde (ANS), de acordo com o estudo.

 

Os autores são os professores Mário Scheffer, do departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e Ligia Bahia do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

 

O relatório aponta que as doações de 2014 somaram R$ 54,9 milhões e ajudaram a eleger a presidente, três governadores, três senadores, 29 deputados federais e 24 deputados estaduais. Outros 71 candidatos receberam doações, mas não se elegeram. Considerando apenas os eleitos, a maior fatia dos recursos foi para o PT (28,73%), seguido pelo PMDB (25, 01%) e pelo PSDB (22,04%).

 

A empresa Amil fez 48% das doações (R$ 26 milhões) dentre as empresas de saúde suplementar. O restante dos grandes volumes foi feito por Bradesco Saúde (R$ 14 milhões), Qualicorp (R$ 6 milhões) e Unimed (R$ 5 milhões). Houve ainda doações médias, entre R$ 150 mil e R$ 1 milhão, e pequenas, abaixo de R$ 75 mil.

 

Os pesquisadores identificam padrões nesses financiamentos. No caso da Amil, o apoio foi maior para a disputa presidencial, concentrando-se em partidos à frente de governos e em candidatos majoritários. A empresa doou a maior parte dos recursos (R$ 7 milhões) para a campanha de reeleição de Dilma Rousseff (PT). Também beneficiou a candidata à presidência Marina Silva (PSB) e os candidatos ao governo estadual de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB) e Paulo Skaf (PMDB).

 

A empresa ainda doou diretamente a partidos que, por sua vez, repassaram recursos para campanhas individuais. O ponto em comum entre os parlamentares beneficiados é a atuação em políticas de saúde.

 

O apoio da Bradesco Saúde compôs as doações do Grupo Bradesco beneficiando candidatos de diferentes partidos. Segundo Scheffer e Bahia, os dados indicam apoio aos mais bem posicionados nas disputas eleitorais, independentemente do cargo, localização ou partido.

 

Já a Qualicorp também doou a maior parte dos recursos (R$ 4 milhões) à campanha de Dilma Rousseff, e uma porção menor ao Comitê Financeiro Nacional do PSDB. Essa distribuição é próxima da que foi usada nas eleições de 2010.

 

A Unimed beneficiou candidatos comprometidos com interesses de suas cooperativas, e que eram ligados a entidades médicas, porém sem apoiar a disputa por cargos majoritários.

 

Para Scheffer e Bahia, essa atuação “insere no cenário político interesses particulares que poderão, no mínimo, levar candidatos a cargos majoritários a postergar a efetivação de políticas públicas de saúde universais”.

 

O levantamento se baseou em dados registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e das 1047 operadoras médico-hospitalares registradas na ANS.

 

Como limitações do estudo, os autores informam que não foi possível identificar os beneficiários finais das chamadas “doações ocultas”, que são feitas aos comitês ou diretórios de partidos, formando um caixa único, que depois é repassado aos candidatos. Possíveis doações ilegais, o “caixa dois” das campanhas, também não são consideradas.

 

Interesses privados e públicos em jogo

 

O sistema de saúde suplementar foi beneficiado pelo crescimento econômico em anos recentes. Houve maior formalização do emprego – 80% dos clientes são de planos empresariais – e aumento da massa de salários, conforme analisam os autores.

 

Iniciativas governamentais também favoreceram o setor, como a permissão para venda de planos mais baratos, com cláusulas que possibilitam restringir a cobertura e dificultar a continuidade dos contratos. Idosos e pacientes com problemas graves e crônicos são os que mais sofrem com essas restrições.

 

Essas empresas são beneficiadas por recursos públicos na forma de linhas de crédito, de isenções fiscais e tributárias. Há ainda planos privados para servidores públicos – vitalícios, sem limite de cobertura para senadores e deputados federais.

 

As seguradoras também são favorecidas pela “dupla porta” de atendimento – quando pacientes de planos privados são atendidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e não há ressarcimento do sistema público.

 

Uma das situações relatadas pelos autores é a nomeação de representantes dos planos de saúde para cargos estratégicos da ANS. O atual diretor presidente da Qualicorp, Maurício Ceschin, por exemplo, foi diretor presidente da ANS de 2010 a 2012, órgão responsável por regular e fiscalizar o setor. Antes mesmo desse posto na agência, já havia estado no comando da empresa.

 

“A ‘captura’ da ANS pelo mercado, por meio da ocupação de cargos na agência, pode ser um dos fatores responsáveis pela fraca atuação e fiscalização do órgão regulador ou pela edição de normas favoráveis às empresas de planos de saúde”, afirmam os pesquisadores.

 

Reforma política e novos estudos

 

De acordo com os autores, os resultados do levantamento podem ajudar na discussão sobre a reforma política no país, já que o financiamento de campanhas eleitorais é um dos pontos mais polêmicos nesse debate.

 

Para os autores, o relatório também poderá contribuir para novos estudos sobre os efeitos dos lobbies e interesses particulares que formam a saúde suplementar e sua relação com o SUS.