Grandes nomes que fizeram história

Patrícia Santos/ComCiência/Labjor/DICYT A cada ano, são mundialmente divulgados grandes nomes da literatura, da economia, das ciências e da luta pela paz que receberão o Prêmio Nobel. Difícil, mas instigante, é pensar quais seriam as personalidades a se destacar entre os 899 laureados nas 567 premiações desde 1901. As histórias de cada um, e do prêmio em si, tornam-se ainda mais interessantes, com o passar do tempo, quando mais detalhes são revelados e ao se observar esses grandes nomes em conjunto.

Mesmo sendo tão concorrido, há quem já tenha sido honrado com o Prêmio Nobel mais de uma vez. É o caso da Cruz Vermelha, que recebeu o Nobel da Paz em 1917, 1944 e 1963. Os dois primeiros prêmios remeteram à sua atuação no período das duas grandes guerras mundiais, e o terceiro, pelo seu centenário. Além disso, o fundador da Cruz Vermelha, Henry Dunant, recebeu o primeiro Nobel da Paz em 1901, pelos esforços em prol do trabalho humanitário e pela paz.

Há também os casos em que o Nobel marcou a história de algumas famílias. O casal Marie e Pierre Curie receberam o Nobel de Física em 1903 pelos estudos sobre radioatividade. Pierre já havia falecido quando Marie recebeu o segundo prêmio, o Nobel de Química de 1911, pela descoberta do rádio e do polônio, por seus estudos sobre rádio e pelo isolamento do novo elemento.

Em seus últimos anos de vida, Marie ainda viu a filha Irene e seu genro Frederic Joliot serem bem sucedidos em suas pesquisas. Um ano depois da morte de Marie, Irene e Frederic dividiram o Nobel de Química em 1935 pelo trabalho em síntese de novos elementos radioativos.

A filha mais nova dos Curie, Eve, também teve sua passagem pela cerimônia de gala. Em 1965, o Nobel da Paz foi concedido ao Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) pelo seu trabalho humanitário e quem o recebeu pela organização – onde Eve trabalhou – foi seu marido, Henry R. Labouisse, então diretor do Unicef.

Diferentes lutas pela paz

Inicialmente, o Nobel da Paz tendia a reconhecer juristas ou personalidades que buscavam a paz através da legislação internacional, segundo analisa Geir Lundestad, secretário do comitê norueguês do Nobel. Depois, vieram aqueles que tinham uma relação de apoio à Noruega, às Nações Unidas e ao Ocidente durante a Guerra Fria. Líderes que lutavam pelo desarmamento ou controle limitado de armas também foram lembrados, além daqueles que atuaram em prol da ética, da luta pela paz e do trabalho humanitário.

Um marco na história do Nobel da Paz, como ressalta Lundestad, é a nomeação de Albert John Lutuli e sua luta pelos direitos humanos. Lutuli foi presidente geral do Congresso Nacional Africano de 1952 a 1967. Ele esteve à frente da luta contra o apartheid na África do Sul e defendeu a não-violência em momentos críticos do congresso.

A premiação de Lutuli, em 1960, foi marcante por representar uma orientação mais global para o Nobel da Paz que, até então, era concedido a personalidades da Europa e da América do Norte. Foi o início de uma nova categoria de premiados que lutavam por direitos humanos. Esse redirecionamento, no entanto, só se concretizou mais efetivamente nos anos 1970 e 1980.

Pela paz e pela química

Entre os que ganharam o Nobel da Paz, também, é notável a premiação de Linus Pauling em 1962. O cientista, que já havia sido laureado com o Nobel de Química em 1954 por explicar o mecanismo das ligações químicas, virou um pacifista militante após sua primeira premiação e dedicou-se a combater as armas nucleares de destruição em massa. Foi o único a ganhar o prêmio sozinho por duas vezes, segundo os registros da Fundação Nobel.

Apesar de ser um nome pouco lembrado pelo grande público, Pauling pode ser reconhecido como um dos maiores químicos do século XX. É autor do livro A natureza da ligação química, considerado um dos mais lidos e influentes na história da química, segundo relata Burton Feldman no livro The Nobel Prize: a history of genius, controversy and prestige.

Revolução na medicina

Linus Pauling se destacava também por ir além da teoria, desenvolvendo pesquisas em estruturas químicas através da difração de raio X. O fenômeno chamado de difração acontece quando uma onda, como a de um raio X, encontra obstáculos. De acordo com Feldman, entre seus feitos, Pauling também é lembrado por sua “quase descoberta” da estrutura do DNA.

Sua suposição, em 1948, era de que o DNA teria uma estrutura com a forma de uma única hélice. A ideia impressionou Francis Crick e James Watson na época. Até então, eles não imaginavam o modelo de dupla hélice que lhes garantiu o Nobel de Medicina posteriormente, em 1962, junto com Maurice Frederick Wilkins.

A descoberta deu início a uma revolução na ciência. A genética e a biologia molecular se tornaram áreas de pesquisa cada vez mais frequentes no Nobel em Fisiologia e Medicina. O assunto também foi atraente para a mídia e para o público, inclusive pelas polêmicas, como o não reconhecimento pela contribuição de Rosalind Franklin para o trabalho de Crick e Watson. Ela já havia falecido quando os dois foram laureados e o Nobel não premia ninguém postumamente.

Física popular

No quesito popularidade, os físicos se sobressaem como categoria em que os nomes são mais conhecidos do grande público e, segundo Feldman, ao mesmo tempo chamaram a atenção para o prêmio Nobel.

Albert Einstein é o exemplo mais evidente, sendo declarado “o homem do século” pela revista Time em 1999. O Nobel para Einstein aconteceu em 1921 por seus trabalhos em física teórica e especialmente por sua descoberta da lei do efeito fotoelétrico. Porém, seu maior trabalho foi a Teoria Geral da Relatividade, que já estava completa em 1915 e cuja confirmação experimental aconteceu em 1919, com a demonstração de que o espaço era “curvo” como ele havia previsto.

Literatura limitada

Talvez o prêmio mais polêmico de todos seja o de Literatura, pelas escolhas feitas ao longo de sua história. Entre os ganhadores, a maioria é de autores em poucas línguas europeias – inglês, francês, alemão e espanhol –, e ainda 14 prêmios para autores em línguas escandinavas, o que, na opinião de Feldman, revela uma limitação linguística do comitê. A língua portuguesa teve seu momento, o primeiro e único até hoje, com o Nobel de 1998 para o português José Saramago.

Samuel Beckett, Nobel em 1969, é reconhecido como um grande nome entre os premiados na literatura, representando também uma abertura do comitê para autores do pós-modernismo. Suas inovações aconteceram de fato décadas antes em obras como a peça Esperando Godot e romances que tiveram sucesso popular como nenhum outro vanguardista havia conseguido.

Memoráveis na economia

Já a categoria mais nova no prêmio, o Nobel de Ciências Econômicas, tem entre seus grandes nomes Simon Kuznets, vencedor em 1971, um excepcional entre os laureados, na visão de Feldman.

Kuznets migrou da Rússia para os Estados Unidos em 1922 e começou a aprender inglês no verão. No outono, ele já havia sido aceito pela Universidade de Colúmbia; em 1923, obteve o bacharelado; em 1924, o título de mestre; e em 1926, o de doutor. Ele então começou a reunir estatísticas sobre demanda, renda, preços, desenvolvimento industrial. Analisou os dados medindo e correlacionando o total dos gastos de consumo nacional, fazendo algo similar para a renda nacional. Isso permitiu conhecer pela primeira vez o total de investimentos em um país, medir suas flutuações cíclicas e a relação entre distribuição de renda e crescimento.

Com maior atenção pública, o Nobel de Economia de 1994 foi concedido a John Harsanyi, John Nash Jr. e Reinhard Selten por esclarecerem e aprimorarem a teoria dos jogos. Ela explora todo tipo de estratégias, econômica, política e militar. Tem implicações em tomadas de decisão desde o planejamento militar ou a negociação internacional, gestão, vendas e compras. “Nenhum modelo econômico é tão pouco convencional ou formalmente sofisticado como a teoria dos jogos”, comenta Feldman.

O motivo da visibilidade, porém, se deve em grande parte à genialidade de Nash. Sua tese de doutorado em Princeton, escrita aos 22 anos, foi reverenciada pelo comitê do Nobel em 1994. Nos anos 1950, antes dos 30 anos, ele sofreu com uma doença mental e ficou incapaz de trabalhar pelos 35 anos seguintes. Após a recuperação, Princeton ofereceu a ele um posto de pesquisa em tempo parcial. Sua história foi tema do filme Uma mente brilhante.