Alimentación Brasil Campinas, São Paulo, Lunes, 26 de mayo de 2014 a las 10:52

Múltiplas características podem definir hábitos alimentares de anfíbios anuros

Pesquisa considera variáveis que englobam características mais diretamente relacionadas à alimentação e outras indiretas, mas que podem influenciar no comportamento alimentar

Michele Gonçalves/ComCiência/Labjor/DICYT - Anfíbios podem parecer animais singelos, parados o dia todo na beira da lagoa, comendo umas mosquinhas de vez em quando. Imaginamos suas escolhas alimentares como algo bem simples, quase um acaso momentâneo, uma libélula desprevenida aqui, uma formiguinha dando sopa ali. Mas, já é de se supor, nada na natureza é tão simples quanto parece. Na verdade, os anfíbios podem possuir hábitos bem complexos, inclusive na alimentação. Esses hábitos, aliás, podem estar evolutiva ou ecologicamente atrelados, de forma indireta, a inúmeras outras características da história de vida desses animais.


Esse foi um dos achados do estudo de mestrado intitulado “ Relações Tróficas entre Anfíbios Anuros e Formicidae no Chaco Brasileiro” , do biólogo Nelson Rodrigues da Silva, pesquisador pela Universidade Federal de Grande Dourados (MS). A pesquisa sugeriu uma metodologia diferente da habitual para tentar classificar os hábitos alimentares desses animais. Normalmente, esses hábitos são definidos segundo poucas características, sendo a principal a própria dieta, através de análises do conteúdo estomacal de animais coletados. A partir dessa dieta define-se a alimentação-base da espécie e, por similaridades, agrupam-se diferentes espécies em grupos alimentares.

 

O pesquisador propôs uma metodologia mais ampla para essa classificação, partindo de um número maior e mais diverso de características, além da dieta, para investigar os hábitos alimentares de diferentes espécies de anuros. Essa proposta veio da suposição de que o comportamento alimentar desses animais pode ser ecológica e evolutivamente definido segundo uma série de outras características que não estão diretamente ligadas à dieta, mas que indiretamente interferem nela. A partir dessa premissa, o biólogo e seus colegas, todos também pesquisadores do laboratório de Ecologia de Formigas da mesma universidade, resolveram olhar para esses animais segundo 34 diferentes variáveis, pré-definidas para cada espécie segundo o conhecimento ecológico da literatura. Essas variáveis englobaram desde características mais diretamente relacionadas à alimentação, como tipo e local de forrageamento (busca por alimento), até características indiretas, distantes dessa atividade, mas que de alguma forma poderiam influenciar no comportamento alimentar e consequentemente na dieta, como, por exemplo, o local de nidificação (construção de ninhos e postura de ovos) e o tipo de desova.

 

Para analisar tantas variáveis os pesquisadores utilizaram métodos estatísticos que agruparam os indivíduos pela presença destas em seu comportamento, nas diferentes espécies analisadas. O estudo foi realizado com animais do bioma Chaco, que engloba uma pequena parte do Mato Grosso do Sul e se estende mais amplamente pelo Paraguai, Argentina e Uruguai. Mais de 200 indivíduos tiveram seus conteúdos estomacais analisados, contabilizando 15 espécies de anfíbios anuros, o que representa cerca de 30% da biodiversidade desses animais no Chaco. No Brasil, esse bioma é pouco estudado e, no entanto, muito impactado pela deflorestamento para pastagem.

 

O resultado das análises foi animador: quatro grupos, separando todas as espécies analisadas, surgiram a partir das similaridades encontradas entre as diversas variáveis. Para testar os grupos obtidos os pesquisadores analisaram o conteúdo estomacal dessas mesmas espécies submetidas à análise. Esse conteúdo foi analisado segundo um parâmetro único: a presença de formigas na alimentação. Novamente, um resultado interessante: dentro desses quatro grupos, dois tinham consumido grandes quantidades de formigas, enquanto outros dois possuíam formigas em menor quantidade em seus estômagos. Esses grupos que comeram mais formigas não coincidentemente eram compostos por espécies associadas à busca por comida em solo, local onde, em princípio, se concentram mais formigas.

 

Esses dados revelam algo curioso: mesmo que as características traduzidas pelas variáveis, as quais definiram os grupos, não estivessem falando diretamente sobre a dieta dos animais, elas ainda assim dividiram os animais de forma que sua dieta foi também contemplada pela divisão. Ou seja: elas (as variáveis) provavelmente estão relacionadas com o comportamento alimentar das espécies dos grupos encontrados, mas não de forma tão evidente.

 

Os resultados são ainda preliminares: será necessária agora uma nova fase de testes de correlação entre as variáveis (para ver se elas estão inter-relacionadas entre si) e graus de significâncias dos resultados encontrados (para conferir a eles evidência estatística). Serão também testados se esses grupos de anfíbios encontrados relacionam-se alimentarmente com grupos específicos já conhecidos de formigas, as chamadas guildas. Os pesquisadores acreditam que possa haver correlações mais específicas entre tipos específicos de anfíbios que consomem tipos específicos de formigas. As formigas que compuseram a dieta das espécies estudadas também foram catalogadas no estudo.

 

Mesmo que tais correlações não sejam encontradas, o estudo contribui para ampliar o campo de variáveis a serem consideradas nos estudos de ecologia alimentar de anfíbios. Assim como encontrado no Chaco, é possível que outros padrões para hábitos alimentares também possam ser encontrados em outros grupos de anfíbios em outros biomas potencialmente ameaçados. A definição de padrões alimentares é importante para viabilizar estudos ecológicos de diversas outras naturezas.