Salud Brasil Campinas, São Paulo, Lunes, 23 de junio de 2014 a las 10:24

Profissionais da obstetrícia abandonam prática de episiotomia

Método utilizado tradicionalmente em partos, tem sua eficácia contestada por membros da classe médica

Cristiane Kämpf/ComCiência/Labjor/Dicyt- A episiotomia é uma incisão cirúrgica realizada no períneo da mulher (área muscular entre a vagina e o ânus) para alegadamente "ampliar o canal de parto" e "facilitar a passagem" da cabeça do feto durante o período expulsivo do parto. A prática, ainda comumente realizada durante a assistência obstétrica no Brasil e no mundo, vem enfrentando forte e crescente oposição de diversos profissionais da área. Eles deixaram de realizar o procedimento ou mesmo nunca o adotaram, alegando falta de evidências científicas que justifiquem sua realização.


Durante o I Simpósio Internacional de Assistência ao Parto: Ciência, Cuidado e Tecnologia (Siaparto), que ocorreu em São Paulo de 01 a 04 de maio e reuniu mais de 800 profissionais envolvidos com a assistência ao parto e ao nascimento, a médica obstetra Melania Amorim apresentou a palestra "Cuidado Perineal: 12 anos sem episiotomias". A especialista afirma ter realizado o procedimento pela última vez em março de 2002 e enfatiza estar atualmente convencida de que não há justificativa para a episiotomia na prática obstétrica moderna. "Foi um longo processo.

 

Aprendi a fazer rotineiramente desde que era estudante de medicina e comecei a não fazer somente depois que terminei a residência, mas ainda achava necessário em muitos casos. Eu sabia das evidências científicas contrárias, mas não conseguia diminuir as taxas. No começo tinha cerca de 80%, depois houve um declínio para 50%, 30%, 10% e finalmente parei de fazer o procedimento. A Medicina Baseada em Evidências Científicas (MBE) me demonstrou que a episiotomia de rotina não era necessária. Lendo Robbie Davis-Floyd descobri as motivações que levam obstetras a repetir ritualisticamente o procedimento, mas verdadeiramente foi ler e ouvir as mulheres que me fez mudar", testemunha a obstetra.

 

Para sua apresentação, além de apontar artigos científicos que questionam o procedimento, Amorim colheu depoimentos de outros profissionais que, como ela, deixaram de realizar a incisão ou mesmo nunca a praticaram. Entre eles está Carla Andreucci Polido, obstetra e docente da Universidade Federal de São Carlos, que disse que precisou apenas não cortar uma episiotomia para entender que ela não é necessária. "Mas esse foi um passo difícil. Eu sempre achava que se não cortasse, seria pior....Até que um dia decidi que não cortaria e lidaria com as consequências...e as consequências são períneos íntegros ou lacerações cujo reparo e recuperação são muito mais simples. Nunca me arrependi de não ter cortado um períneo".

 

Leila Katz é obstetra tocoginecologista, trabalhando atualmente no Instituto de Medicina Integral Prof. Figueira, em Recife (IMIP), em seu depoimento a especialista – que há nove anos abandonou a prática da episiotomia - afirma que considera o procedimento "igual à mutilação genital feminina". Maíra Libertad, enfermeira obstetra e atualmente doutoranda em Ciências Médicas na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) afirma nunca ter realizado o procedimento em oito anos de prática. Ana Cristina Duarte, obstetriz, coordenadora do Gama (Grupo de Apoio à Maternidade Ativa) e organizadora do I Siaparto, realizou a incisão uma única vez em seis anos de prática e confessa: "não há um dia em que eu não me arrependa de tê-la aberto". Roxana Knobel, obstetra e docente na Universidade Federal de Santa Catarina afirma ter realizado, no passado, várias episiotomias "acreditando que estava salvando o períneo e a vida sexual das mulheres". Atualmente a especialista está há seis anos acompanhando nascimentos sem cortar o períneo das parturientes.

 

Muitas dessas profissionais são ativistas do movimento pela humanização do parto no Brasil e atuam na docência de obstetrícia em várias instituições de ensino superior. Seus alunos, futuros médicos, estão, portanto, aprendendo como não realizar episitomias e, assim, entrando em contato, durante sua formação, com o que pode ser parte de um novo paradigma para o atual modelo obstétrico brasileiro.