Ciencias Sociales Brasil Campinas, São Paulo, Viernes, 23 de octubre de 2015 a las 10:51

Projeto de comunicação deve promover aproximação entre público jovem e ciência

Experiência deve envolver diversas mídias e deve se valer de um financiamento coletivo para arrecadar recursos

Felipe Guerra-Labjor/SP/DICYT - Uma das grandes questões dos jornalistas a respeito do jornalismo científico é: como compreender e adaptar conteúdo muitas vezes tão complexo a uma linguagem acessível ao público leigo? Não há uma resposta fácil, mas escolas de jornalismo do mundo todo têm trabalhado nisso há décadas, sempre em busca de novas respostas que se encaixem às tecnologias da atualidade. O Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo da Unicamp, o Labjor, é pioneiro nesse trabalho no Brasil.

 

Mas e quando esse público é jovem e pode ter sido desestimulado, no decorrer da vida, a se aproximar da ciência? Há alguma fórmula certeira conhecida para convidá-lo a conhecer melhor o campo científico? Aparentemente não. Mas a jornalista e pesquisadora Mariluce Moura, especialista com carreira consolidada no campo da divulgação científica, resolveu buscar respostas e experimentar possibilidades com um projeto: o Ciência na Rua.

 

A ideia da jornalista é estabelecer um meio de comunicação direcionado a jovens de 14 a 25 anos, que contará com linguagem leve e recorrerá às principais tecnologias dessa geração, como as mídias sociais digitais. Não tende a ser um caminho fácil, pois cada ferramenta tem a sua própria linguagem ideal, mas Mariluce, que, entre tantos trabalhos e projetos, atuou durante 20 anos na Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e é responsável pela criação da revista Pesquisa Fapesp, um dos mais conhecidos periódicos brasileiros de divulgação científica, está empenhada em compreender meios de dialogar com esse público. “Comecei a pensar nesse projeto em 2009, depois de perceber que tudo o que tinha feito em jornalismo científico era voltado ao público bem formado. Ou estavam na graduação, ou na pós-graduação, ou já era profissional bem preparado”, disse.

 

Com esse pensamento veio a impressão, desconstruída logo em seguida, de que talvez apenas pessoas com passagem pelo ensino superior (em formação ou formadas) compusessem o público leitor dos veículos de divulgação científica no Brasil. “Parecia que ninguém abaixo dos 18 anos estava lendo essa produção. Mas uma pesquisa do Datafolha encomendada pela Fapesp indicou que o jornalismo científico tinha, sim, leitores inseridos no ensino médio, por exemplo. Para nós foi muito surpreendente e positivo”, explicou Mariluce.

 

Essa nova percepção indicou a possibilidade de haver caminhos diferentes para se estabelecer uma comunicação ideal com esse público específico. “Minha ideia é [fazer o projeto] chegar às pessoas que têm ‘buracos’ na formação, mas que estão trabalhando nisso. [Para isso] A proposta é criar e articular diferentes meios de comunicação e distintas linguagens culturais”, disse. Entre essas linguagens pretendidas estão vídeos, artes gráficas e visuais (como os quadrinhos), textos e, inspirada em experiências educativas bem-sucedidas, jogos educativos. As possibilidades são várias, também pelo fato de o público-alvo ser bastante expressivo e plural: a pesquisadora relatou que há aproximadamente 30 milhões de pessoas com 14 a 25 anos no Brasil.

 

Para oferecer conteúdo que se encaixe à agilidade permitida pelas tecnologias digitais da atualidade, Mariluce reconhece: para criar e manter um vínculo com o público, é importante marcar presença constantemente nas mídias utilizadas por essas pessoas. “É um público que está o tempo todo trocando informação, sempre em alta velocidade”, disse, ressaltando que, apesar da leveza pretendida na comunicação, a ideia passa longe de tentar abordar as informações apontando-as apenas como curiosidade. “O Ciência na Rua não vai tratar dos assuntos apenas como curiosidade ou novidade, mas também como informação sobre a produção de conhecimento científico”, complementou.

 

Estruturando o projeto


A estrutura principal do Ciência na Rua, que será construída gradativamente, consistirá em quatro ferramentas principais: a primeira delas, já em desenvolvimento, é o portal na internet, que deverá ser compatível com diversos aparatos que acessam a internet, como computadores, celulares e tablets, e acolherá conteúdo em diversos formatos. O público terá acesso, por exemplo, a colunas escritas por especialistas, notícias diárias sobre temas nacionais e internacionais, charges, cartoons, quadrinhos e quizzes relacionados aos temas abordados, vídeos conciliando humor e ciência e jogos educativos.

 

O passo seguinte será a produção de um tabloide semanal com oito páginas; os últimos consistem na produção de um programa de televisão e um de rádio. “Por trás disso está a proposição de uma experiência de jornalismo e divulgação científica trabalhando com crossmedia [oferta de conteúdo em diversas mídias, tanto físicas quanto digitais] e com forte base no humor para potencializar a aproximação com públicos não tão familiarizados com os temas”, explicou Mariluce.

 

Apesar de o Ciência na Rua já estar tomando forma, a estruturação do projeto está sendo feita de modo rigoroso e respeitando uma série de etapas, que incluem o levantamento de experiências internacionais similares à proposta da jornalista e a intensa pesquisa de linguagens apropriadas para cada um dos tipos de ferramenta pelos quais os leitores poderão acessar o conteúdo. Com isso, a previsão é que a produção de textos e imagens para o portal comece em outubro de 2016. O Labjor será parceiro do projeto e colaborará com pesquisas para a confecção de uma ferramenta eficaz de comunicação.

 

Para angariar fundos que contribuirão com o desenvolvimento do projeto, Mariluce recorreu à plataforma de crowdfunding (financiamento coletivo) Kickante para encontrar apoiadores: clique aqui para obter mais informações e colaborar com o projeto!

 

E a representatividade na ciência?


Entre os tópicos abordados por Mariluce em palestra realizada para alunos da especialização em Jornalismo Científico Labjor, e que estão sendo levados em conta no projeto, a representatividade feminina é um dos que merece grande atenção.

 

A pesquisadora trouxe dados preocupantes publicados em julho pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação no estudo “Percepção Pública da Ciência e Tecnologia no Brasil”. Se, por um lado, a pesquisa apontou que 61% dos entrevistados (a partir dos 16 anos) demonstraram interesse por ciência e tecnologia, por outro o público feminino apontou, em diversos recortes possíveis (por idade e região, por exemplo), ter menos interesse pelo assunto do que o público masculino. Com dados disponíveis em um portal interativo sobre a pesquisa, constata-se, por exemplo, que 29,4% das mulheres declararam ter pouco interesse em ciência e tecnologia, ante 21,3% dos homens. Também há diferenças expressivas nas outras respostas a respeito do interesse por ciência.

 

Mariluce criticou a visão que se parece ter construído a respeito da ciência como uma profissão destinada ao gênero masculino. “Essa é uma diferença muito séria. Para mim, não tem nada de natural nisso. É, ainda, uma questão cultural [na abordagem] de gênero. Fico pensando em como trabalhar isso no âmbito da comunicação”, ressaltou.

 

A própria turma de alunos do Labjor compõe um público que demonstra uma ideia oposta à de que ciência é “para homens”: entre cientistas e comunicólogos, 26 mulheres integram um grupo de 40 alunos. “É uma questão que realmente me preocupa. Gostaria que o Ciência na Rua contribuísse para [mudar] isso. É chocante”, declarou.