Salud Brasil , Brasil, Lunes, 22 de marzo de 2010 a las 14:11

Sites sobre saúde interferem na relação entre médico e paciente?

Pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz irão avaliar e certificar sites de saúde

Clara Montagnoli/ComCiência/Labjor/DICYT Um fenômeno recente, que tem crescido no mundo inteiro em função do imenso alcance da internet, resultou no surgimento do “paciente expert”, pessoa que busca informações sobre sua própria doença em sites voltados a questões de saúde. O termo foi adotado por um grupo de pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Rio de Janeiro, que vêm desenvolvendo pesquisas sobre o assunto, que tem pautado estudos também nos Estados Unidos e Europa. O objetivo do grupo brasileiro é descobrir até que ponto o acesso a sites sobre saúde interfere no relacionamento entre os médicos e seus pacientes.

 

Com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj), no valor de cerca de R$ 100 mil, foi construído um laboratório onde serão feitas avaliações sobre a qualidade das informações contidas em sites de saúde. O laboratório fica anexo ao Centro de Saúde da Fiocruz, que atende uma população de baixa renda, habitante de uma área próxima ao campus. O público atendido nesse Centro de Saúde é portador de doenças crônicas, tais como tuberculose e diabetes.

 

Segundo André Pereira Neto, historiador e pesquisador da Fiocruz que compõe a equipe que vem desenvolvendo o projeto, “o principal perfil de usuário é de pessoas que buscam informações sobre sua doença em sites e em comunidades virtuais”. Por meio dessas comunidades virtuais, esses pacientes encontram outras pessoas com quem podem compartilhar suas experiências. A ideia de ter esse laboratório junto ao Centro de Saúde é poder contar com a participação dos pacientes ali atendidos na avaliação dos sites.

 

O Comitê para Democratização da Informática (CDI), uma ONG de apoio à inclusão digital, irá disponibilizar dois instrutores e um supervisor, para orientar os pacientes na análise dos sites. “Enfatizamos a importância do ponto de vista do usuário dos sites de saúde na internet”, explica Pereira Neto.

 

Ele aponta que a internet se revelou uma ferramenta importante para a manutenção da saúde das pessoas. Um dos benefícios é que a rede incentiva a mudança de comportamento. “Existe um longo período entre o momento em que alguém obtém uma informação e aquele em que promove uma mudança em seus hábitos, e a internet contribui para acelerar esse processo”. Infelizmente, nem sempre de forma positiva, uma vez que a internet oferece também informações fraudulentas e mal intencionadas. Além disso, é um meio de grande visibilidade para a propaganda de empresas farmacêuticas, o que a maioria das pessoas não sabe identificar. Desse modo, muitos sites defendem o uso de alguns medicamentos que podem ser prejudiciais à saúde humana. Há ainda outras questões, segundo Pereira Neto. “Um dos sites que analisamos, por exemplo, defendia e incentivava a anorexia, com dicas de como ficar mais magra e esconder os hábitos estranhos dos pais”, diz.

 

O objetivo dos pesquisadores é fornecer um selo de qualidade para os sites. Segundo Pereira Neto, a ideia não é censurar as informações, mas apenas certificar e indicar os sites mais adequados. Para descobrir se as informações têm qualidade ou não, serão usados na análise três tipos de indicadores: de conteúdo, ou seja, a atualidade da informação; de navegabilidade, que significa saber se o site é lento ou mal diagramado; e do usuário, em que os próprios pacientes vão poder opinar sobre a legibilidade da informação.

 

Além dos pacientes, Pereira Neto alerta que há médicos, com formação mais precária, que também costumam recorrer à internet para tirar suas dúvidas. Essa situação levou os pesquisadores a buscarem uma parceria com a Federação Nacional dos Médicos (Fenam). “Pretendemos fazer uma seleção de sites para os médicos, principalmente, aqueles que não sabem ler em inglês e, portanto, não têm acesso a publicações especializadas, o que é uma realidade no Brasil”, observa.

As avaliações ainda não tiveram início, mas Pereira Neto diz que a seleção dos sites analisados será feita de acordo com os mais acessados, ou seja, os que aparecem na primeira página de busca pelo Google. “Uma pesquisa apontou que a maioria das pessoas não passa da primeira página”, diz.

 

Mais usuários a cada dia

 

Hoje, a maioria dos usuários que consultam sites sobre saúde são mulheres entre 30 e 40 anos, com acesso à internet no trabalho. “No entanto, os jovens também têm participado ativamente de discussões em comunidades virtuais, principalmente em sites de relacionamento, onde podem trocar experiências com pessoas da mesma idade”, conta. No Orkut, existem comunidades do tipo “Tenho diabetes, e daí?”, “Quem eu amo tem diabetes”, “Prevenções às DST’s”, “Amigos da tuberculose”, entre outras.

Nos fóruns dessas comunidades virtuais, os usuários tratam principalmente de experiências pessoais a respeito dos efeitos de determinados medicamentos, do atendimento nos hospitais, tipos de tratamento, entre outros temas relacionados à doença. Para Pereira Neto, que defende a decisão compartilhada entre o médico e o paciente, é importante que o paciente tenha consciência do tratamento e do remédio que está tomando.

 

Tradicionalmente, o médico era o único detentor das informações. Hoje, se ele não se mantém atualizado sobre as novidades na internet, corre o risco de perder a confiança dos pacientes conectados com a rede. C.R., que preferiu não se identificar, é técnica em enfermagem e faz tratamento para depressão há mais de dez anos. “Gosto de trocar ideias com o médico e colocar a minha opinião, sem fazer simplesmente o que ele quer”, diz. Frequentemente, ela busca novos remédios e experiências de outras pessoas em sites que considera confiáveis. “Se percebo que o médico está receitando um medicamento muito antigo, reclamo ou troco de médico”, conta.

 

No entanto, Pereira Neto não acredita na desprofissionalização do médico após esse novo fenômeno. “Não há nada que se compare à experiência prática de anos de um médico”, afirma. Provavelmente, os médicos não vão perder a autoridade sobre os diagnósticos para a internet, mas certamente a relação entre eles e seus pacientes será mais igualitária, graças ao acesso democrático às informações sobre saúde.