Salud España , Salamanca, Viernes, 24 de abril de 2015 a las 12:02
INESPO II

Os motoristas têm má memória

Uma investigação da Universidade de Salamanca permite verificar que guiar diminui a eficiência do cérebro em outras tarefas que tenta realizar simultaneamente, como fixar na memória dados de uma conversa

José Pichel Andrés/DICYT O Grupo de Investigação Reconhecido em Memória e Cognição da Universidade de Salamanca anda a estudar há anos vários alguns processos da memória humana, especialmente as abundantes distorções sofridas em condições normais. Uma dessas linhas de investigação, em colaboração com especialistas dos Estados Unidos, levou-o a analisar o que acontece quando uma pessoa está a guiar um automóvel. Os experimentos demonstram que a eficácia de lembrar informações recebidas nesta situação é mínima.

 

“Está comprovado que falar ao telefone causa problemas para guiar, não só pelo facto de usar as mãos, mas também por fazer duas coisas ao mesmo tempo”, explica a DiCYT Ángel Fernández Ramos, investigador deste Grupo da Faculdade de Psicologia, quem cita estudos de David Strayer, da Universidade de Utah. No entanto, “nós estamos interessados no caso contrário, não só falar ao telefone é mau para guiar, mas guiar também é mau para lembrar o que você está a falar ao telefone”.

 

Para além do interesse puramente científico, esta questão tem aplicações bem relevantes, uma vez que “o maior argumento de muitas empresas para incentivar o uso do telefone no carro é aumentar a produtividade e nós estamos a desmascarar esse mito, pois você não só não é mais produtivo, mas é mais perigoso. Por isso não vale a pena”.

 

Em colaboração com os investigadores estado-unidenses, que têm sofisticados simuladores de condução, onde podem manter um controle da atividade cerebral por meio de eletroencefalografia, os cientistas da Universidade de Salamanca projetaram uma série de experimentos que demonstraram a impossibilidade de fixar recordações eficazmente na mente durante a condução.

 

Por exemplo, ordenavam os participantes seguirem um carro no simulador ao mesmo tempo que ouviam uma série de palavras que posteriormente tinham de lembrar. O resultado foi que diminuíam as respostas corretas enquanto as falsas memórias aumentavam significativamente em relação a outras pessoas que ouviram as palavras sem guiar.

 

Pontos-chave das falsas memórias

 

Para além desta linha de investigação no campo da condução, a equipa de Ángel Fernández Ramos anda a trabalhar em torno das falsas memórias há muito tempo. “É muito fácil fazer alguém se lembrar de qualquer coisa que nunca ouviu nem leu”, assegura. A psicologia experimental realiza experimentos para manipular as variáveis que influem nestas distorções da memória, a fim de compreender as causas. “Se temos uma lista de palavras onde se incluem termos como lua, estrelas e escuridão, por associação de ideias, os indivíduos julgam também se lembrar de que ouviram a palavra noite, mesmo que não é verdade”, explica.

 

Ao longo dos anos, a equipa de investigação realizou inúmeros testes deste tipo com resultados reveladores. A idade é uma das chaves que fazem a diferença. “As crianças mais novas têm mais memórias distorcidas, porque são muito influenciáveis e confundem fantasia e realidade, mas em alguns casos têm menos erros, porque ainda não têm a experiência suficiente para associar conceitos”, comenta o investigador. Este tipo de investigação tem aplicações interessantes em determinadas áreas, tais como os tribunais de justiça, por exemplo, para discernir até que ponto o testemunho de uma criança ou jovem deve ser considerado relevante em maior ou menor grau.

 

Os experimentos também fazem possível analisar as estratégias utilizadas pelo cérebro para se lembrar. Assim, o número de erros diminui quando o adulto que participa na experiência é informado de que vão tentar enganá-lo para se lembrar de alguma palavra relacionada com a lista, o que lhe permite “marcar para relembrar”, para poder identificar mais facilmente, por exemplo, que noite não estava entre as palavras ouvidas. As crianças não podem fazê-lo. No entanto, este tipo de monitorização mental costuma errar se o indivíduo é pressionado por outras circunstâncias, como ter um tempo muito limitado para responder.

 

No caso da condução, “quando os participantes são avisados de que vamos preparar uma palavra para induzir o erro, o número de fracasso é menor, mas guiam pior”, ilustra o cientista da Universidade de Salamanca. Os motoristas acionam o travão mais tarde ou têm mais confusões na tomada de decisões, como apanhar a saída correta, quando tentam executar tarefas paralelas relacionadas com a memória.

 

As conexões entre palavras

 

Um aspecto derivado destes estudos tornou-se um outro campo de investigação interessante para este grupo, que faz parte do Instituto Universitário de Integração na Comunidade (INICO) da Universidade de Salamanca: a elaboração de regras de associação para as palavras. Oferece-se a uma pessoa uma lista de 250 palavras para escrever o primeiro termo que relaciona a cada um deles; quando o exercício é realizado por muitos indivíduos, estatisticamente aparecem fortes associações como mesa e cadeira ou carta e amor. Deste modo, comprova-se cientificamente, de maneira empírica e quantitativa, que termos como lua, estrelas e escuridão estão relacionados com noite e em que grau.

 

Os investigadores já elaboraram as regras associativas para mais de 7000 palavras do espanhol e, gradualmente, estão a disponibilizá-las para a comunidade científica, porque as aplicações deste conhecimento são muito numerosas. “Poder-se-ia estudar se nos casos de Alzheimer desaparecem antes as conexões associativas, como maçã e Eva, ou as semânticas, como maçã e pera”, exemplifica.

 

Além disso, os seres humanos estabelecem muitas mais conexões com as palavras que aprendem mais cedo, pelo que outra linha de investigação deste grupo analisa a idade de adquisição das palavras. As mais antigas na nossa mente são as mais comuns na língua, leem-se mais rápido e produzem mais ligações.