Amnésia alcoólica pode levar a confiar em fontes de informação pouco seguras
Aline Naoe/ComCiência/Labjor/DICYT O esquecimento provocado pelo consumo de bebidas alcoólicas ingeridas por estudantes universitários ajudou pesquisadores do Reino Unido a compreender melhor o processo de reconstrução da memória. Segundo os pesquisadores, “os apagões proporcionam uma excelente oportunidade para estudar as estratégias que as pessoas utilizam para reconstruir experiências esquecidas”. O estudo relatado no artigo "Reconstructing alcohol-induced memory blackouts" (em português, "Reconstruindo apagões de memória induzidos pelo álcool") revela que as pessoas tendem a querer reconstruir os fatos esquecidos, o que pode levá-las a construir falsas memórias.
“Os dados mostram que o desejo das pessoas de ‘preencher os espaços em branco’ pode levá-las a confiar em fontes pouco confiáveis e pode também encorajá-las a adotar um critério de monitoramento de fontes mais fraco”, relata o estudo conduzido pelos psicólogos Robert Nash, do Departamento de Psicologia da Universidade de Surrey, e Melanie Takarangi, do Departamento de Psicologia da Universidade de Leicester. Tal monitoramento “mais fraco” diz respeito ao fato de que as pessoas, por desejarem completar as memórias esquecidas, flexibilizam o critério de confiança, especialmente se há poucas fontes de informação disponíveis. Ou seja, elas adaptam seus critérios à sua necessidade.
A pesquisa foi feita a partir de questionários com 280 estudantes universitários, dos quais 85% se afirmaram como consumidores de álcool e mais da metade relatou já ter passado por um apagão, total ou parcial, provocado pela bebida. “Nossos resultados contribuem com a crescente literatura acadêmica sobre as estratégias das pessoas para validar suas experiências passadas e destaca o importante papel de fontes externas no processo de reconstrução”, dizem os pesquisadores. Em comparação com estudantes que nunca haviam sofrido um apagão causado por álcool, os demais apresentaram uma motivação significativamente maior a confiar em amigos bêbados e ainda uma leve tendência a acreditar neles como a fonte mais confiável.
Tais constatações podem parecer inocentes quando se fala em ambiente universitário, porém os estudiosos levantam algumas questões importantes. As pessoas que sofrem apagões podem se envolver em comportamentos de risco, como brigas, uso de drogas e relações sexuais. Há casos que sugerem que pessoas inocentes já chegaram a confessar crimes por terem sido levadas a acreditar que os havia cometido quando estavam sob o efeito do álcool. Além disso, há também a possibilidade de induzir pessoas que sofreram apagões a fazer falsas acusações contra terceiros.
O trabalho foi publicado na edição de agosto da revista científica Memory. O resumo do artigo pode ser acessado nesse link, onde o texto completo pode ser adquirido.