Space Portugal , Oporto, Friday, January 21 of 2022, 12:48

Universidade do Porto lidera descoberta de exoplaneta com forma de bola de rugby

Investigação liderada pela cientista Susana Barros no âmbito da Missão Espacial CHEOPS detetou pela primeira vez a deformação de um exoplaneta

UP/DICYT Chama-se Wasp-103b e orbita uma estrela 1,7 vezes maior e cerca de 200 graus mais quente do que o Sol. Este novo exoplaneta, estudado por uma equipa internacional liderada por Susana Barros, investigadora do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IAstro) na Universidade do Porto, tem a particularidade de ter aproximadamente a forma de uma bola de rugby. O estudo, com base em novas observações efetuadas pela missão espacial CHEOPS, da Agência Espacial Europeia (ESA), foi agora publicado na revista Astonomy & Astrophysics.

 

Segundo Susana Barros, “este resultado é fruto de vários anos do nosso trabalho no IAstro, para desenvolver modelos de deformação de planetas e modelos de análise de dados de extrema precisão. Isto permitiu-nos liderar este estudo dentro do consórcio do CHEOPS, cuja extrema precisão permitiu detetar pela primeira vez a forma deformada de um exoplaneta”, acrescenta a também investigadora do Departamento de Física e Astronomia da Faculdade de Ciências da U.Porto.

 

Assim como a gravidade da nossa Lua “puxa” a Terra (o que origina o movimento dos oceanos conhecido como marés), também a gravidade do Sol puxa o nosso planeta. Felizmente, devido à grande distância a que o Sol está de nós, a sua gravidade é insuficiente para provocar uma deformação muito significativa da superfície do nosso planeta.

 

Esse não é, contudo, o caso do Wasp-103b, um exoplaneta que está tão próximo da sua estrela, que demora apenas um dia a completar uma órbita. Com uma proximidade tão extrema, há muito que os astrónomos desconfiavam que as enormes forças de maré provocadas pela estrela resultariam numa enorme deformação do planeta, que até agora não tinha sido possível confirmar.

 

Graças à combinação de observações de trânsitos do exoplaneta, efetuadas pelo CHEOPS, com dados já conhecidos do Telescópio Espacial Hubble (NASA/ESA) e do Telescópio Espacial Spitzer (NASA), a equipa conseguiu confirmar que o planeta é, de facto, mais largo no equador do que nos polos, tendo uma forma aproximadamente semelhante a uma bola de rugby. Mas a grande precisão das observações do CHEOPS pode ser usada para revelar ainda mais informações acerca da estrutura interna deste planeta deformado.

 

Este cálculo é feito determinando o número de Love, um parâmetro físico que mede como é que a massa se distribui pelo planeta. No caso do Wasp-103b, o número de Love tem um valor semelhante ao do maior planeta do Sistema Solar, o que parece sugerir uma composição interna semelhante embora os planetas estejam em ambientes muito diferentes.

 

“Em princípio seria de esperar que um exoplaneta com 1,5 vezes a massa de Júpiter tivesse mais ou menos o mesmo tamanho”, explica Susana Barros. E acrescenta: “Devido à proximidade com a sua estrela, o WASP-103b é muito quente, com uma temperatura de 2500 K. Pensa-se que isto é a causa do planeta ser inchado relativamente a Júpiter, com um diâmetro duas vezes maior. Assim, é bastante interessante que a estrutura interna dos dois planetas seja semelhante”.

 

“Apenas um primeiro passo”


Devido à pouca precisão no cálculo do número de Love, serão necessárias mais observações com o CHEOPS, complementadas com observações na banda do infravermelho com o recém lançado JWST – Telescópio Espacial James Webb (NASA/ESA), que irão melhorar ainda mais as medições de deformações por forças de maré de exoplanetas. “Se conseguirmos determinar a sua estrutura com mais observações, podemos perceber melhor porque é que o planeta está tão inchado. Saber o tamanho do seu núcleo será ainda importante para perceber como se formou este exoplaneta”, esclarece Susana Barros.

 

Nuno Cardoso Santos (IAstro & DFA-FCUP), o investigador principal da equipa de Sistemas Planetários do IAstro, nota por sua vez que “este resultado ilustra bem o potencial da missão CHEOPS e a capacidade da equipa do IA para fazer ciência inovadora. Mas este é apenas um primeiro passo. Mais observações da missão CHEOPS, bem como dados que vão ser recolhidos por missões futuras, como a PLATO, vão dar-nos a possibilidade de estudar a deformação em mais exoplanetas, e assim dar mais saltos em frente no seu estudo detalhado”.

 

Há ainda outro mistério a resolver acerca do WASP-103b, descoberto pela equipa: As forças de maré num planeta tão próximo da sua estrela normalmente provocam um abrandamento da sua órbita, levando a órbita do planeta a decair, até este ser eventualmente engolido pela estrela. No entanto, a velocidade orbital do WASP-103b parece estar a aumentar, com o planeta a afastar-se da estrela.

 

A equipa testou vários cenários para explicar este comportamento, como a presença de uma estrela companheira ou até a órbita do exoplaneta ser mais elíptica do que o previsto, mas os dados não permitem concluir qual a opção correta. Só com dados adicionais será possível esclarecer se este aumento de velocidade de facto existe, e nesse caso, o que o provoca.

 

Na linha da frente


O consórcio do CHEOPS é liderado pela Suíça e pela ESA. Conta com a participação de 11 países europeus, sendo que em Portugal a participação científica é liderada pelo IAstro . Esta participação faz parte, por sua vez, de uma estratégia mais abrangente para promover a investigação em exoplanetas em Portugal, através da construção, desenvolvimento e definição científica de vários instrumentos e missões espaciais, como o CHEOPS ou o espectrógrafo ESPRESSO, já em funcionamento no Observatório do Paranal (ESO).

 

“O nosso papel de liderança nestas missões e projetos permite-nos estar na primeira linha destes resultados. No caso do CHEOPS, além de termos desenvolvido software para a missão, temos investigadores, como a Susana Barros, que lideram grupos de trabalho para a exploração dos dados”, destaca Sérvio Sousa, investigador do IAstro /U.Porto.

 

A estratégia do IAstro irá continuar durante os próximos anos, com o lançamento do telescópio espacial PLATO (ESA) em 2026, da missão ARIEL (ESA) em 2029, e a instalação do espectrógrafo HIRES no maior telescópio da próxima geração, o ELT (ESO), que deverá entrar em funcionamento em 2030.