Health Spain , Salamanca, Wednesday, January 30 of 2013, 12:15

“A pesquisa biotecnológica pode mover o tecido econômico de um país”

O pesquisador do CNIO, Óscar Fernández-Capetillo, recebe o II Prêmio Nacional de Investigação em Câncer ‘Doutores Diz Pintado’ e defende mudar o modelo de translação ao paciente dos resultados da pesquisa básica

JPA/DICYT Óscar Fernández-Capetillo, cientista do Centro Nacional de Investigações Oncológicas (CNIO), recebeu no dia 28 em Salamanca o Prêmio Nacional de Investigação em Câncer ‘Doc¡utores Diz Pintado’ no ato acadêmico organizado pela Universidade de Salamanca com motivo da festa de São Tomás de Aquino. O premiado explicou sua linha de pesquisa, demandou um melhor financiamento para a Ciência e apostou por uma translação mais rápida e eficiente dos resultados da pesquisa básica ao paciente.

 

Neste sentido, ainda que parte de sua experiência seja com pesquisa básica, o pesquisador do CNIO se mostrou muito preocupado porque os estudos biomédicos têm que transpor muitos obstáculos no caminho que começa com a pesquisa básica e vai até a administração de novos medicamentos aos pacientes, segundo as declarações coletadas pela DiCYT. Por um lado, “ninguém, aparte de uma companhia farmacêutica, pode arcar com os gastos”, afirma, porque se trata de um custo superfaturado que em sua opinião “é exagerado”.

 

Por outro lado, considera que o processo pelo qual se traduzem os compostos aos pacientes é muito rígido, de modo que as vezes um medicamento é jogado no lixo porque não serve para todos os pacientes de uma determinada doença quando na verdade já se sabe que não existe o câncer de pulmão como uma doença única, por exemplo, já que apresenta aspectos muito diferentes, de modo que, se um composto dá bons resultados, somente deveria ser aplicado em alguns pacientes. A chave está “em adivinhar em quem deve ser aplicado o que”, explica. Definitivamente, “a translação deveria ser mais fluída, mas se não é rentável economicamente, é descartada. Minha geração precisa lutar para mudar as cosias”, agregou.

 

O pesquisador premiado explicou sua linha de pesquisa, focada na instabilidade genômica e suas repercussões, especialmente no câncer. “O problema de todos os tumores é que estão constituídos por suas próprias células”, indicou. Em outro tipo de doenças, como as doenças infecciosas, o objetivo é “matar o que não faz parte de você”, mas no caso do câncer as terapias envolvem atacar os próprios tecidos do paciente, e isto tem efeitos prejudiciais também para as células sadias. Assim, desde o século XIX os pesquisadores tentam diferenciar as características exclusivas das células tumorais.

 

Uma dessas propriedades é a instabilidade genômica, isso é, que as células apresentam um grande número de mutações. “O genoma dos tumores é distinto e isto pode não ser somente uma particularidade, mas a causa do câncer”, comenta o especialista. Assim, há poucos anos as pesquisas sobre instabilidades genômicas estão em auge, tratando de entender questões como os mecanismos que protegem as células sadias dessas mudanças que sofrem as tumorais.

 

Envelhecimento marcado a partir da gestação

 

Outra linha de pesquisa do grupo de Fernández-Capetillo é o envelhecimento, já que biológicamente está muito relacionada com o estudo do câncer. “Envelhecemos porque acumulamos danos no genoma”, isso é a mesma coisa que acontece com os tumores. Neste sentido, “uma das coisas que descobrimos no laboratório é que a velocidade com a qual envelhecemos pode estar condicionada ao estresse que sofremos na fase embrionária, isso que, que desde a gravidez se determinaria como envelheceremos no futuro”, ainda que o que cada pessoa faz ao longo de sua vida também tenha influência.

 

Fernández-Capetillo falou também da polêmica desatada por Jamen Watson, co-descobridor da dupla hélice DNA e prêmio Nobel, ao criticar há alguns dias atrás o rumo que tomou a pesquisa do câncer. Desde que os Estados Unidos decidiram investir muito dinheiro no câncer sempre existiram duas posturas, comentou o especialista, uma que aposta por seqüenciar os tumores para encontrar todas as mutações e outra, representada por Watson, que considera que não importa como seja o procedimento, o importante é eliminar o câncer, mas “o debate já está fora de moda”, afirma Fernández-Capetillo, porque o sequenciamento é cada vez mais barato e na verdade existem recursos suficientes para abordar a questão de outras perspectivas.

 

Otimismo científico

 

Sua linha de pesquisa é só “uma gota de água no mar”, já que existe outras abordagens para o câncer que podem ser interessantes. Assim, Fernández-Capetillo encontra razões para o otimismo mundial na luta contra o câncer: “Minha geração verá muitos processos tumorais crônicos sujeitos a terapias que possam controlá-los bem”, afirma.

 

No entanto, também reconhece certo pessimismo em um aspecto mais pessoal, porque sabe que cientistas muito qualificados em seu próprio laboratório, formado por pouco mais de dez pesquisadores, têm “zero possibilidades de ficar na Espanha”.

 

O premiado reconheceu que teve muita sorte ao montar seu laboratório há uns anos em uma época de bonança econômica, mas que o panorama mudou. “Nosso mérito foi fazer-nos perguntas que funcionaram e abandonar a tempo as que não funcionavam”, enfatiza, explicando que seus projetos foram desenvolvidos fundamentalmente através do financiamento captado da Europa e dos Estados Unidos.

 

Falta de patrocínio

 

Precisamente por isso valoriza os 15.000 euros que recebe como prêmio da Fundação para a Investigação do Câncer da Universidade de Salamanca em memória dos doutores Manuel e Alfonso Diz Pintado, através de sua irmã Esperanza Diz Pintado, para reconhecer o esforço e a trajetória científica do melhor jovem pesquisador espanhol nascido a parti de 1967. No entanto, este patrocínio é uma exceção, já que um dos problemas do financiamento da ciência na Espanha é, precisamente, a falta de investimento privado, porque não existe a mentalidade adequada, além de que a estrutura do Estado não favorece este tipo de iniciativas através de incentivos fiscais, por exemplo.

 

Em sua opinião, é um “problema educativo e cultural”, porque apesar do papel da indústria biotecnológica, por exemplo, nos países nórdicos, referências de bem-estar, não se acredita que a pesquisa possa ser um motor econômico. Contudo, Fernández-Capetillo considera que o papel da pesquisa biomédica no tecido econômico “é tão potente que pode mover um país”.

 

Ao seu lado diante dos meios de comunicação esteve presente Eugenio Santos, diretor do Centro de Investigação do Câncer (CIC), que destacou também a “enorme qualidade” das pesquisas de Fernández-Capetillo e seu reconhecimento internacional. “É um líder científico e seguirá sendo”, agrega.

 

Na mesma linha se manifestou a vice-reitora de Investigação da Universidade de Salamanca, María Ángeles Serrano, que explicou que neste ano o número de candidaturas para conseguir este prêmio passou de 12 a 26. Na primeira edição deste prêmio o vencedor foi Manel Esteller por seus trabalhos com epigenética.